quarta-feira, 10 de março de 2010

25655

Provavelmente o tempo desconversa
E traz a realidade sobre a mesa,
A par do que se vende por surpresa
A sorte noutra senda segue imersa,

São crápulas deveras, nada mais,
E quando se percebe tais figuras
Diversas das que tanto me asseguras
Serem caricaturas, mas reais.

Embustes entranhados por sucesso
Paspalhos compram luzes dos falsários
E quando se percebem tais corsários
O preço que se paga é retrocesso.

Recebo quem quiser na minha mente,
E assim psicografia se desmente...

25656

Não tanto quanto pude perceber
Vendidas pelas ruas falsas telas
E nelas ilusões tantas revelas
Perpetuando o golpe do não ser.

Escrotas divindades, botequins,
Nas aguardentes todas represento
O peso de um completo desalento
E como se pudessem tão ruins

Os versos que costumo ler. Deveras,
Auto-crítica faço e me permito
Dizer que nem nos meus eu acredito,
Aquém do que precisas ou esperas.

Porém não admitindo uma mordaça
Por mais que escrotidão, eu sei já grassa....

25654

O pensamento ronda que ainda
Não pode discernir qualquer verdade,
Aonde se quisera quase abade
A porta se fechara e assim se finda

A luta de um vazio por talvez
Querer ser algo mais e nunca expondo
Realidade aos poucos decompondo
Mesmo que em tal tolice sei que crês

O parto trouxe apenas tosco feto,
Apática figura filosófica
A face se mostrando quase atrófica
E nela com certeza me incompleto,

Purgando dentro em mim a força insana
Aonde em podridão a voz se emana...

25653

Não venha me falar do quanto existe
Do medo ainda vivo nos estúpidos
Momentos onde mesmo em toscos, cúpidos
Olhares se percebe ao fundo o triste.

Esquadros e compassos, réguas tês
E tanta engenharia não permite
Que o sonho ultrapassando algum limite
Diverso do que teimas e não vês,

Acuda esta versão aonde o nada
Transgride e traz no olhar terror e dolo,
E quando vez por outra em vão me imolo
A história há tanto tempo degradada

Esvai-se enquanto a vida se perdia
Na torpe sensação de hemorragia...

terça-feira, 9 de março de 2010

25652

Erotismo não é vulgaridade!
São coisas bem diversa disso eu sei
E não vou discutir censura ou lei
Por mais que esta falácia desagrade.

Apenas não me sinto constrangido
Em comer uma bela bucetinha,
Se preferir então, pererequinha
Sem ela o meu viver não tem sentido.

Perdoe, mas eu acho mais bonito
Do que falar em cópula, o trepar
Eu sei que isto parece mais vulgar,
De fraque, por favor, mudando o rito

É coisa que deveras não fascina,
Invés de uma xereca, uma vagina...

25651

Até o pobre Cristo é cafetão
Assim não dá mais pé, meu bom judeu,
O mundo de tal forma se perdeu
Maior do que o Senhor, grana e tesão.

O sexo é coisa boa, isso eu não nego,
Também que viva a festa e a bacanal,
Só não suporto mais cara de pau
Não vou ficar quietinho nem sou cego.

Em nome do MEU PAI, já vale tudo,
Aonde poderia ser altar
Agora transformado em lupanar,
Não vou ficar aqui bancando o mudo.

Só pensando em caralho, cu, buceta.
Em nome do Senhor? NÃO. DO CAPETA.

25650

Não perco um carnaval, destes, cristãos,
Adoro tomar umas vez em quando
Deu confusão? Depressa vou sarrando
A mão vai passeando pelos vãos.

A moça faz carinha de coitada,
Mas gosta desta puta sacanagem,
A bunda arrebitada dá coragem,
Nas coxas de um babaca uma encoxada

E seja tudo em nome do Senhor,
A putaria toma toda a praça
É reza misturada com cachaça
E nisto o pessoal faz seu louvor.

Olhando lá pra cima logo avisto,
Pedindo ao Pai perdão de novo, Cristo...

25649

Sagrado este direito, não renego
E viva sem temor, não é pecado,
Olhando de soslaio bem safado,
Senão vou acaba ficando cego.

A bunda quando vai rebolativa
Bagunça o meu coreto, dô na pinta
A cara de safada é de faminta
Da rola a pílantrinha não se priva.

E assim bendita seja entre as mulheres
A mais gostosa musa do pedaço,
Tem gente que garante que é cabaço
Banquete para cem, dez mil talheres.

Pra cantada responde sempre não,
Assim vou acabar mesmo é na mão...

25648

Ao cutucar uma onça em vara curta
Mexendo com a tal moralidade
Tesão é coisa nobre e quando invade
Não dê qualquer vacilo e logo curta

Melhor do que ficar tocando bronha
Fingindo de santinha do pau oco
Brincando com pauzinho quer um toco
Dê tudo e não precisa ter vergonha.

O sexo tá na Bíblia é bem sagrado,
É coisa que alivia uma tensão,
De vez em quando solte um palavrão
Pra que bancar assim, bem educado?

Delícia sem igual: uma buceta,
O celibato é coisa do capeta!

25647

Não vou ficar chorando esta miséria
Tô vivo, isso é que importa, companheiro,
Depois de ter morrido por inteiro
A coisa na verdade andando séria

Renasço sem um puto no meu bolso,
Nem mesmo trabalhar tranqüilo eu posso,
O mundo continua o mesmo troço
A casa sem retoque nem embolso,

Assumo os meus pecados, vou em frente
Fodido e bem mal pago, sim senhor.
Poeta já não tem nenhum valor,
Tomando fluoxetina estou contente.

Calmante? Se está caro pra chuchu,
Melhor então mandar tomar no CU!

25646

Já não suporto mais tanto vacilo,
E se estou me fudendo, azar o meu,
Quem tanto na verdade se fudeu
Da fudelança agora faz estilo.

Na boca da madame uma piroca
Bagunça o seu coreto, faz a festa,
Abrindo vem em quando a sua fresta
Do garotão, a rola, a porra entoca

Depois vai fazer plástica na cara
Na bunda e no peitão só silicone,
O dia passa junto ao telefone
Falando pras amigas escancara.

Marido na poltrona está roncando
E a vaca com um touro só chifrando...

25645

Enquanto o besteirol assim se alastra
A merda do soneto vira pó,
Não vou ficar aqui pedindo dó
Verdade se repete e não se castra.

Melhor fazer textinho onde testículo
Apronta confusão e dá ou desce,
Ou então aprendendo reza ou prece
Decoro vez por outra algum versículo

Se falo não explico só complico
Ninguém quer entender porra nenhuma,
Se o mundo proutras bandas já se ruma,
Preciso e mais depressa ficar rico.

Cansado de escrever tanta besteira,
Da sorte só levando uma rasteira...

25644

Que a putaria enfim seja bem vinda
E trague a todos muita fantasia,
Assim invés de reza, numa orgia,
Beleza sem igual já se deslinda

Calcinha aparecendo da mocinha
Fazendo um reboliço do caralho,
Tentando poesia me atrapalho,
Escrevo sem a métrica e convinha

Buscar um tratamento ou me virar
Cansado de pensar em sacanagem,
Falar de amor, agora, uma bobagem,
É coisa de boiola e não vai dar

Olhando prum espelho em auto-crítica,
Melhor outro caminho: o da política...

25643

Mandando tudo à puta que pariu
Cansado desta vida de panaca
Aonde uma verdade não se empaca
O resto da maneira que se viu.

Levando vez por outra uma porrada,
Chamando de meu louro, um urubu,
Vontade de mandar tomar no cu,
E dar na minha vida uma guinada.

A porra do soneto me vicia,
Não faço mais sequer um pensamento,
Assim vou acabar sem um provento,
Fudendo com a merda: poesia.

Ó Pai, Senhor Vê logo se me acuda
Preciso aprender logo uma auto-ajuda...

25642

Brasil já tá na moda sim senhor,
Europa vai ficar tupiniquim,
Tem gente que tá vendo nisto o fim,
Apocalipse agora? Noutra cor.

“Auriverde pendão” da putaria,
As coisas vão ficar muito melhor,
O resultado disso sei de cor
O mundo terminando numa orgia.

Tremendo e mais festivo bacanal,
Político trepando com a freira
Pastor paga boquete e de bobeira
Desfila novo enredo, o carnaval,

O patrocinador, outrora brama
Agora deve ser mister Obama...

25641

Não deixo de pensar em putaria,
A gente faz das nossas vida afora,
Velhice vem trazendo sem demora
O fim da minha história. Quem diria...

Depois de ser na vida acostumado
A dar de vez em quando uma trepada,
Agora vou tentar, amigo e nada,
Não tenho vocação para veado.

Pensando nos meus tempos, áureos tempos...
Eu vejo que fui bom na sacanagem,
Ficando só mirando esta paisagem
Não suportando assim tais passatempos.

Pior é que a verdade sempre arrocha,
Depois de tanto tempo. Fiquei broxa...

25640

Depois de muitos anos, garanhão
Agora ficou brocha. O que fazer?
Nem mesmo uma punheta dá prazer,
Cansado de ficar sempre na mão

Tá mole, mas tá duro pra caralho,
Sem grana não consegue um aditivo,
No dedo, todo dia um curativo,
A língua já deu câimbra. Que paspalho!

Vizinha peladinha na janela,
Mulher vive roncando a desgraçada,
Calmante toda noite? Uma furada.
Comendo a gostosona só na tela.

Diante de uma dor assim profunda
Vai acabar é dando a sua bunda...

25639

Vagaba, meu amor, um elogio.
Da meninada a moça faz a festa
Verdade é que não dá. Somente empresta.
A porra nunca sai do eterno cio.

Mamãe tá me esperando no portão.
Assim diz a piranha para mim,
Eu acho que virei um querubim,
Por que meu Deus, eu vivo ouvindo o não?

Sei que sou feio, mesmo pra caralho
Porém isso o Zequinha também é
Além de ter frieira e ter chulé
A moça vez ou outra dá seu talho..

Sonhando com a porra da buceta,
Só resta ao infeliz tocar punheta...

25638

Mandar alguém pra puta que pariu
Faz bem para a saúde, eu te garanto,
Melhor do que ficar curtindo pranto
Tremenda babaquice é ser servil.

Manda tomar no cu? Melhor ainda.
Mas tem que prestar nisso algum cuidado
Se o camarada vive acostumado
Um outro resultado se deslinda.

Poeta no Brasil, tudo babaca,
Prefiro a bucetinha da morena
Cultura nacional tá dando pena,
Assim é que esta porra já se empaca.

Leitura filosófica e profunda?
Só serve pra poder limpar a bunda!

25637

Chupando logo a rola de um otário
A moça arrebitando o seu cuzinho,
Vontade de trepar devagarinho,
Na rua, no sinal, atrás do armário.

A puta faz sucesso co’a galera
Ninguém deixou de comer tal putinha,
Mas sei que na verdade não foi minha,
Será que vale à pena alguma espera?

Agora está virando sapatão,
Lambendo muita xana por aí,
Com tanta sacanagem percebi
Só faz para chamar uma atenção,

Mas anda num caminho todo errado,
O cara viva noutra, pois viado...

25635

Coçando a perereca esta vadia
Posando de putinha num Orkut
Verdade é que a tevê já nos incute
Vontade de fuder que me extasia.

Assim caminha a nossa mocidade,
A putaria está super na moda
O tempo vai passando e tudo roda,
Aonde vai parar a liberdade?

Xereca raspadinha da piranha
E o rabo do traveco balançando,
Poeta se fudendo em fogo brando,
Nem para o seu almoço o puto ganha.

Querendo um lugarzinho neste céu
Eu virar é dono de motel!

25636

Lavando com lavanda a bucetinha
A moça depilada em siririca
Assim vai terminar ficando rica
Bancando pra mamãe uma santinha.

Rodízio de boquete na balada,
E a puta numa rave demorô.
Já deu para papai, filim, vovô
Aranha com aranha? Acostumada.

Vagaba de primeira sob a saia
Calcinha se enfiando na xereca,
Carinha de menina esta sapeca
Caindo toda noite na gandaia.

Domingo vai pra missa. Obrigação?
Que nada, pois o padre é um tesão...

25634

Imensa putaria no Congresso
A vaca da mulher tá na playboy
Assim a dignidade se corrói
E ainda vem falar “ordem/progresso”

Verdade quando dita sempre dói
E quando estou calado, eu me tropeço
Fazendo da emoção erro confesso
Quem tanto construiu tudo destrói.

Buceta faz sucesso na internet
A porra da poesia se intromete
Matando o que restou de uma esperança;

Verdade seja dita, minha amiga,
A coisa desse jeito já periga,
Repito então aqui: VIVA A FUDELANÇA!

25632

Aonde se queria a primavera
O tempo não deixando restar nada,
Outono se transborda e na alvorada
Somente o frio imenso nos tempera,

Assim a vida traz tão longa espera
E nela o que se vê sonega a estada
Que um dia imaginei delineada
Em sonhos; mas a história degenera

E o quanto se queria em nova luz
Inverno desdenhoso reproduz
E assim vamos seguindo sem paragem.

Viver cada momento intensamente
Sabendo que o futuro não se sente,
Aproveitando assim a mansa aragem...

25633

Saudade dita normas complicadas
É como o renascer de algum defunto,
Falando sempre assim do mesmo assunto
Caminho se perfaz nestas estradas

Há tanto conhecidas no passado.
Beber no mesmo copo esta aguardente
Por mais que ainda queira só se sente
O gosto do retrato amarelado.

Lembranças do que foi? Não, minha amiga,
Retrovisor traduz em capotagem
E quando se prepara outra viagem
Esqueça, por favor daquela antiga.

Saudade, se inda tenho por aqui,
Somente do que outrora não vivi...

25631

Não quero ser bonzinho nem panaca
O tempo me ensinou a ter defesas,
Preparo a cada dia fortalezas
Senão a minha mula já se empaca.

Ficar com esta cara de imbecil?
A bunda já não vai ficar exposta
Tem gente que em verdade disto gosta,
Eu mando para a puta que pariu.

Vestindo de palhaço ou de bufão,
Cansado de levar tanta porrada,
Na vida agora só dando pernada,
Se bobear eu tasco um bofetão,

Mas levo de gaiato o meu viver,
No fundo o que eu desejo é ter prazer...

25630

O amor nos apresenta multiforme
Às vezes nos faz bem ou nos faz mal,
Caminho com certeza desigual
Pois enquanto acordado, ela bem dorme,

E quando noutra senda se transforme,
Baixando o santo, é briga na geral,
É canivete, foice até punhal,
Na cicatriz que tenho tão enorme.

Assim vamos levando nossa vida,
Às vezes muito bem, outras nem tanto,
Um curativo sana uma ferida

Depois recomeçamos ladainha,
Verdade se contém nisto que canto,
Só sei que sou só teu e tu és minha...

25628

Quem dera se esta lua protegesse
Amantes que se buscam noite afora,
Apenas tão somente nos decora
É como se um divino ser tecesse

Em prata maviosa fantasia
E dela inspiração para se amar,
Mas quando se escondendo este luar
Escuridão tomando a cercania

Ausência de seus brilhos, lua amada
Trazendo tanta dor a quem sonhara,
A noite que já fora bela e clara,
Agora totalmente transformada,

Que faço se este brilho raro e bom,
Ofusca-se nas noites em neon?

25629

Às vezes te procuro, cara amiga
E vejo que talvez fosse melhor
Ficar com prejuízo bem maior,
Pois logo recomeças com tal briga,

E assim o que fazer? Manter a calma...
Somente e nada mais, seguir em frente.
Sem ter sequer alguém que te apascente
Nem mesmo algum carinho inda te acalma.

Melhor sofrer calado, isso eu garanto,
A gente não combina mesmo não,
Armando este barraco em profusão,
Prefiro segurar a dor e o pranto,

No mais, tá tudo bem, e aí contigo?
- Verdade? Nem a pau, querida eu digo...

segunda-feira, 8 de março de 2010

25627

Aonde se escondeu a estrela fria
Que tanto se fez falsa em noite escura,
O quanto me perdi em tal procura
Minha alma sem remédio se esvazia

E o bêbado funâmbulo traria
A queda sobre a pedra turva e dura
Sinal do quanto valho e em tal loucura
Somente me restando a ventania.

Abrindo as escotilhas inda vejo
Naufrágio de um estúpido desejo
Amanhecendo em vão, tosca quimera,

E o passo sem sentido ou direção
Dizendo quanto a vida fora em vão
Não tendo uma emoção sequer que espera...

25599

Qual fora perseguindo este raro astro
Depois de tempestades no horizonte
Sem sol que ainda veja e não desponte
O barco não tem leme e perde o mastro,

Afundo enquanto em dores eu me alastro,
Mergulho no abissal buscando a ponte
Que um dia poderia ser a fonte
Não vendo do futuro sequer rastro.

Rastejo sobre pedras, réptil vago
E a morte com prazer ainda afago
Beijando a sua boca em podridão,

E o medo não produz qualquer mudança
A faca no pescoço adentra e avança
Com fúria numa exata direção.

25598

Razão de cada sonho mais audaz,
O verso que pensara ter valia
Aos poucos se transforma em voz vazia
E nele na verdade tanto faz.

O passo preferido leva ao nada
As chances não teriam mais valor,
O medo novamente ao meu dispor
Mudando esta visão tão deturpada.

Aspectos variados, beijo e corte,
Afiando assim a faca e o canivete
E quando ao nada ter já se remete
A seca dominando algum aporte,

Nesta aridez minha alma se detém
E morre solidária, sem ninguém...

25597

Extraviando a rota em tal seqüestro
Vestindo esta mortalha e enlutado,
O beijo pela dor silenciado,
Momento mais feliz sequer orquestro,

E sendo nesta vida tão canhestro
Percebo tão somente o mesmo enfado
E nele refazendo o meu passado,
O verso sequer tento nem adestro.

Esgoto os meus anseios no vazio,
E quando a realidade aqui desfio,
Enceto-me em mortais caricaturas,

Servindo aos meus senhores, sou o nada,
A sorte tantas vezes desprezada
Distante do que queres e procuras.

25595

Aonde se pensasse em liberdade
O ser humano muda toda a história
Bisonha criatura que em vanglória
Destroça o que inda houvesse em quantidade.

Estúpida quimera vaga solta
E traz nos seus olhares fogo e fúria
Mortalha se desenha em tal incúria
Deixando em polvorosa e tão revolta

A nave-mãe que um dia se fez nobre
E agora mero esgoto, mal suspira
Na mão de um verme inválido esta pira
Com bruma e com veneno a mãe encobre,

Depois deste serviço em vão completo
O rei dos animais? Simples inseto...

25596

De quem se fez feliz e quer bem mais
Apenas um sorriso não acode
Além do que deveras inda pode
Enfrenta estes terríveis abissais.

Eu sinto que o final já se aproxima,
Mordazes os momentos mais cruéis,
E neles enfrentando os velhos féis
O quanto é necessária alguma estima.

Estigmas que carrego são vulgares,
Mas tento disfarçar um ledo engano
Mudando a direção em novo plano,
Retorno sem saber aos tais lugares

Esgarço-me e demonstro em cada parte
O que se fez inútil e já descarte...

25586 até 25594

25586

Bebendo desta fonte poluída
Por tantas e terríveis ilusões
Na verdadeira face que me expões
A tradução perfeita para a vida.

A porta escancarada traduzida
No todo que deveras decompões
Aonde ao meu destino não opões
Verões em plena neve, tudo acida.

E quando esta carcaça se permite
Usar de uma esperança qual limite
Errático fantasma segue a trilha

E mesmo quando em fétidos aromas
O nojo neste instante; tu já domas
Minha alma em tom bem pálido rebrilha.


25587

Apenas os espinhos entranhando
A pele já desfeita em podridão
E o quanto novos dias mostrarão
Resumo de um momento amargo e brando,

As rapineiras chegam, ledo bando
Fazendo do cadáver, divisão,
Mortalha se tornando meu colchão
O mundo cada parte devorando.

Afasto-me dos sonhos, bebo as trevas
E quando te aproximas também cevas
Os restos deste espectro que inda sobram,

Deveras me entregando não resisto,
Sabendo que o culpado maior disto
Sou eu, e os meus demônios vêm e cobram.

25588

Resignado prossigo meu caminho
Rumando para a morte incontestável
Figura assaz comum e detestável
Satânico percorro e vou sozinho,

Nefasto caminhar me leva ao ninho
Deveras como fosse um intragável
Destino deste ser tão deplorável
Nos túmulos de uma alma vã me aninho.

E riscando os espaços nada deixo,
Sequer um rastro fétido. Não queixo
Sabendo ser assim a minha sorte,

Depois de tantos erros, desventuras
Nas mãos esta vergasta em que torturas
Condenas com escárnio à fria morte.


25589

Jogado pelas ruas como um pária
Já não pertences mais ao mundo que
Tentaste conhecer, mas já não vê
Figura caricata uma alimária.

Esgota-se por si tão temerária
Imagem deturpada que se crê
Maior do que deveras já se lê
No olhar ensimesmado da alma otária

Expondo esta faceta apodrecida
Ainda pensa ter alguma vida
E morto, perambula por aí,

Um cão entre outros cães e nada mais,
Nos sórdidos retratos vãos, venais
Sorrindo de si mesmo tal zumbi.


25890

Murmúrios prenunciam noites fartas
Em trevas adiando uma esperança
As nuvens provocando rara dança
Enquanto da alegria tu te apartas,

Jogando sobre a mesa as mesmas cartas
Somente o funeral de uma alma avança
Sarcástica figura em aliança
Futuro desde já sei que descartas.

E morto em vida segues qual fantoche
Exposto aos vis sarcasmos e ao deboche
Rolando sem destino nem paragem,

A podridão sondando cada passo
Que dás rumo ao vazio que ora traço
Selando em tom mais fúnebre a paisagem.


25891

Na lúgubre paisagem tal mortalha
Esboça este retrato mais fiel,
O olhar degenerado rompe o céu
E voa libertários corvo e gralha

Apenas quando vejo esta batalha
A faca se transforma em carrossel
Girando vagamente segue ao léu
Enquanto a realidade se atrapalha,

Adentrando no peito o canivete
A morte transcorrendo em paz intensa
Satânico caminho recompensa

A boca apodrecida me remete
Ao lago em placidez sob a neblina
Ao qual a nossa vida nos destina.

25892

Numa ávida ilusão feita quimera
A boca se escancara furiosa
Enquanto a própria vida já se glosa
Apascentar a fúria de uma fera

E dela toda a sorte degenera
E muda esta faceta cor de rosa
Agrisalhando o olhar se ri e goza
Do pânico que atroz, em todos gera.

A morte se mostrando nua e crua
Deveras nos tortura e continua
Atormentando até chegar o fim

E pútrido penhor nos devolvendo,
A carne noutra pasta convertendo
Aduba das daninhas o jardim.

25893

Mesquinhos abandonos em que vejo
Uma alma demoníaca e desnuda,
Penando a cada dia sem ajuda
Entregue aos vagos nãos de um vão desejo.

Afasto-me do espelho que me traz
A face decomposta deste estúpido
Aonde se fizera outrora cúpido
Agora se demonstra mais mordaz,

Voluptuosamente insaciável
Satânicos momentos que vivera,
E em cada deles sempre convivera
Com fera de perfil mais intratável

E entranha-se na podre criatura
Que mesmo após o fim atroz, perdura.

25894

Aonde se pensara em lucidez
A pútrida impressão do nada ser
A morte se aproxima e sinto ter
Nas mãos a mais completa insensatez

O quanto a realidade já desfez,
Caminho que cansei de percorrer
Fantoches do passado a recolher
O mundo que criara se desfez

Só resta então a podre sensação
Carcaça deste ser que sendo vão
Adentrando neblinas mais funestas

As cinzas coletando vida afora,
Apenas este odor fétido ancora
Imagem decomposta à qual te emprestas.

25583

Os lábios que me beijam, descorados
Satânicos orgasmos prometidos
E assim entre demônios as libidos
Traduzem os delírios mais ousados

E quando se percebem estes Fados
Os fardos que carrego sendo urdidos
Por mãos destes canalhas desvalidos
Em dias com certeza mais nublados,

E as tramas nas quais vejo o meu retrato
Estúpidas quimeras desacato
E forjo outra saída mais sutil,

O rosto que se vê num vão espelho
Sulfídrica figura em tom vermelho,
Bebendo o sangue expõe meu lado vil.

25584

Medonho caricato; eu nada tenho
Somente o soçobrar da embarcação
A morte se traduz em podridão
E assim perpetuando um vago empenho

Mergulho neste abismo que se abriu
E nele percebendo estas carcaças
Diversas das que geras quando passas,
No olhar mais demoníaco e assaz vil

Encontro as garatujas que pintara
Em formas mais bisonhas e satânicas
Tétricas figuras, mas orgânicas
Praguejo contra a sorte, tão amara

E erguendo-se por sobre o mar bravio
A Serpe num etéreo desafio.

25585

Vestindo esta carcaça feita em vida
Ainda não consigo a liberdade
Na morte com certeza rompo a grade
Enquanto este delírio se decida,

Há tempos a minha alma vai perdida
Vivendo a cada dia enquanto brade
Apodrecida face diz metade
Completa-se em total insanidade
E prepara feroz a despedida.

No cerne da questão ser ou não ser
Sentindo a cada dia envilecer
O que restara ainda deste nada

No não ser me completo e assim percebo
Que cada vez bem mais disto me embebo
Até que a noite chegue, em vão... Nublada.

25581

Amargos e violentos os delírios
Quebrantos que percorro em vã neblina
A morte pouco a pouco me fascina
E nela posso ver vagos martírios

Esboço reações, mas não consigo
Vencer putrefações tão costumeiras
E nelas as verdades são bandeiras
Expondo a cada passo outro perigo,

E teimo contra as forças das marés
Vigorosos, soturnos temporais
Entranhando estes vermes triunfais
Ainda permaneço sobre os pés

E sinto que se abala a frágil base
Por mais que a morte ainda em vão se atrase.

25582

Das sombras, ressurgido Satanás
Vasculha nas entranhas deste que
Agora já sabe, mas só vê
O medo que se estampa, amargo e assaz.

Enquanto a névoa densa já me traz
No olhar entorpecido o que se crê
Este fantasmagórico buquê
Moldado num sorriso mais mordaz,

Eu sinto a minha pele apodrecida
E assim tomando toda a minha vida
Hercúleas emoções expondo a nu

A carne que deveras decomposta
Seduz a rapineira e cada posta
Devora com prazer este urubu.

25580

Amordaçada sorte não me ilude
E dela me esquivando a cada passo
E quando outro momento ainda traço
Bem mais do talvez uma atitude

E necessário crer que a juventude
Ainda tenha em mim qualquer espaço,
Deteriorado sonho, me desfaço
E bebo a podridão, cruel açude.

Erguendo então um brinde ao nada ser
Esboço algum sorriso, mas percebo
Que quanto mais a morte em ti concebo

Maior deveras vejo o meu prazer
E sei que na verdade rapineira
Eu sinto a minha voz mais traiçoeira.

25579

Diária por saber felicidade
Cobrada de um poeta vagabundo
Num ágio sem igual, expondo o imundo
Caminho aonde a sorte me degrade

Mordazes os momentos em que luto
E teimo contra a força das marés
Sabendo meu amor por que tu és
O vento é cada vez mais forte e bruto.

Carvalhos arrancados na raiz
Escárnios costumeiros repetidos,
E os ócios contumazes das libidos
O tempo tanto afirma, mas desdiz.

E o jogo não termina e se refaz
Levando para sempre alguma paz...

25577

Pois temos neste amor, sinceridade
E tudo é tão fugaz. Mas mesmo assim
Teimamos e tentamos crer enfim
Que há sorte, mesmo contra a realidade.

O beijo se mostrara mais venal,
E o quarto de dormir desarrumado
Demonstra a insanidade do passado,
E o porto abandonando a tosca nau

Argúcia se transforma em heresia,
Ecléticas vontades deslindadas
As hordas muito mal acostumadas
Enquanto esta mentira desfazia

Uma alma em tais mosaicos enredada
Sabendo que ao final, não resta nada...

25578

E nada nos maltrata ou atrapalha
Durante a caminhada sem destino,
E quando nos teus braços sou menino
Amor é fogaréu, mas pouca palha.

O gesto de abandono nunca falha
Vontade de partir, mas me domino
E o gozo anunciado, eu determino
Qual fosse um mero campo de batalha.

Permissivos desvios são vulgares
E neles muitas vezes seus esgares
Nefastas realidades se apresentam.

Marcados pela brasa em carne viva,
Enquanto esta verdade já me priva
Os dias são iguais e me atormentam.

25576

Na ponta de uma faca ou de navalha
Os dedos decepados da ilusão
Os dias com certeza não terão
A mesma face escusa da medalha,

E quando a fantasia em vão se espalha
Tomando e negrejando esta amplidão
Perdendo há tanto tempo a direção
O corte se apresenta e nunca falha.

Acordo entre os espinhos mais comuns
Seleciono e guardo mesmo alguns
Sabendo desta herança em podre face.

O peso não suporto e se me dobro
A força ainda teimo e assim desdobro
O mundo feito em dor, vazio impasse...

25575

Contamos com a força da verdade
Para podermos ter alguma chance
E mesmo quando a treva ainda avance
O gosto de um prazer sequer invade.

A pútrida faceta escancarada
Carranca que devora e não sossega,
A sorte sendo audaz se mostra cega
E traz após tempesta o velho nada.

São lúdicos caminhos, disto eu sei,
Enamorada luz não me acompanha,
Falácias se perdendo em tola sanha,
Carcaça resta sobre a amarga grei.

E o beijo desencarna este fantoche
E dele a própria vida faz deboche...

25574

E somos prisioneiros deste sonho?
Jamais aceitaria esta falácia,
Não tendo nem sequer qualquer audácia
O que fizeste em trevas não componho.

E mesmo quando a vida não embace-a
A sorte se transtorna em ar medonho,
E o bêbado sem luzes, sou bisonho,
No sangue quase não existe hemácia...

A porta destrancada e mesmo assim,
A podridão expressa de onde vim
O parto se abortara e a vil placenta

Deveras desenvolve-se e sobeja
Ainda tem o olhar de quem deseja
Embora a vida nega e desalenta.

25573

Que se faz renovado a cada dia
O sonho mais audaz aprisionando
E mesmo se mostrando vez em quando
Realidade há tanto já não guia.

A farsa se desvenda e ora recria
Um templo onde prevejo em tosco bando
O gozo necessário desarmando
A podre condição, torpe heresia.

Compêndios não bastaram nem um tomo
E quando a fortaleza invado e tomo,
Saqueio os meus demônios e os desfaço,

Mas tudo se transborda em falsas luzes,
Deveras aos infernos me conduzes
Seguindo sem pensar vou passo a passo...

25572

Nas lutas que travamos, eu reponho
As armas já perdidas no passado
E quando me percebo amargurado
Ainda sem sentidos, teimo e sonho.

O caso é o que o futuro é tão bisonho
E nele quando estou mais entranhado
Percebo que não resta nem bocado
Do todo aonde às vezes decomponho.

A porta se fechando diz do quanto
Apenas herdaremos desencanto
E toda esta ternura fora inútil

Assento-me deveras sobre o fardo
Assim o passo audaz mato ou retardo
Sabendo que o viver se tornou fútil...

25571

Vontade muito além do que dizia
Poema de um antigo companheiro
No quadro desenhando vou inteiro
Deixando para trás a fantasia,

E a morte anunciada não permite
Sequer que eu veja um brilho onde não tem,
O passo desdenhoso nega o bem
E o peso ultrapassando algum limite

Extraio poesia da cachaça
E nela me inebrio e sem sentido,
O quanto desejara é dividido
E quem procura bem logo rechaça

Empórios em total liquidação
Meus olhos, novos dias não verão...

25570

No mundo que queremos, mais risonho
Apenas leves sombras reconheço,
O tempo se transcorre e não mereço
Sequer a fantasia que componho.

Eu vejo o meu futuro em tom medonho
A sorte já não sabe um endereço
E tudo variando sem começo
E quando canto assim, eu sei me exponho

Ridículos os dias sonhadores!
Matamos o jardim, queremos flores?
Não vejo nisto algum sentido, amiga.

Exatas são as nossas recompensas
Se as labaredas vejo sendo imensas
Destino em desatino já periga...

25568

E assim, nada nos cala, nem alcança,
Tampouco nos trazendo algum prazer,
Inércia costumeira posso ver
Nas mãos de quem matou minha esperança.

A sorte se mostrando em tal vingança
Sorrindo de soslaio me faz crer
Que ao menos poderia parecer
Melhor quem no vazio ora se lança.

Ocasos em terrível firmamento,
E quando novas sendas inda tento
Atento aos dissabores, não me culpo,

E verso sobre o tanto que talvez
Ainda nunca viste e já não crês
E o fim em sordidez agora esculpo.

25569

Nós somos passageiros da alegria?
Quem dera minha amiga, quem me dera...
Aonde se escondeu a primavera
Que o inverno nunca mais nos largaria?

Espreito da janela e bem queria
Matar se ainda viva fosse a fera,
Mas quando a fantasia nos tempera
A boca escancarando uma ironia.

Exaltamos loucuras e fantoches
Expondo nossos dias aos deboches
Sarcásticos palhaços, dois bufões.

E temos histriônicos caminhos
Medonhos, mas sublimes passarinhos
Que matas quando em risos tu te expões...

25567

De par em par, querida, a mesma dança
A vida se enlaçando com a morte
Sem ter quem na verdade ainda aporte
O brilho necessário, sem mudança

Ao deus dará meu sonho já se lança
E nele com certeza sem um norte,
Aprofundando sempre mais o corte,
Quem tenta novo dia nunca alcança.

Assomam-se terrores mais freqüentes
E quando tempestades tu pressentes
Assisto à derrocada em camarote.

Heréticas manhãs não me seduzem
E os dias ao final quando conduzem
Preparam com prazer último bote...

25566

Sentindo o teu respiro junto a mim
Eu vejo retratado o quanto fora
A vida em falsas luzes, tentadora,
Num átimo em teu lábio carmesim

A angústia discernindo de onde vim
Uma alma muitas vezes sedutora
Morrendo ao se sentir reveladora
Extremamente estúpida; eis meu fim.

Não posso desvendar velhos mistérios
E quando o tempo dita seus critérios
As farpas penetrando em carne viva

São pregos e tenazes que me prendem
E os sonhos finalmente já se rendem
Enquanto a fantasia agora priva...

25564

Pensara que este estúpido destroço
Vagando pelas ânsias do não ser,
Ao crer no emaranhado de um prazer
Além do que em verdade já não posso,

Esgueiro-me entre redes e mortalhas
A serpe me acompanha em risos fartos,
Aonde imaginara novos partos
Apontam-me os olhares várias falhas.

E sei que talvez tenha tal coragem
De em falsas ilusões não mergulhar
Salgando com as lágrimas meu mar
Aonde não se vê sequer miragem,

Desertos me acompanham desde cedo,
E aos vastos deste nada eu me concedo...

25565

Um pesadelo horrível num segundo
Anunciando o fim da poesia
E quando esta verdade já se urdia
Deixara há muito tempo o tosco mundo

Retrato o meu passado tolo e imundo
Enquanto um novo tempo se recria
E nele morta em dor a fantasia
O velho coração de um vagabundo

Anseia algum momento em abundância
Revive o sortilégio de uma infância
Aonde o privilégio de sonhar

Vivenciara sempre com prazer,
E agora ao se notar e nada ver
Mergulha no vazio especular...

25563

Numa alegria augusta; eu me aprofundo
Embora saiba bem a estupidez
Que a cada passo dado, mais tu vês
E dela sem defesas vou ao fundo

E vendo destroçado um peito imundo
Tomado por total invalidez
O peso do passado já desfez
A rota de um canalha vagabundo.

Apertando este cinto eu sei o quanto
O bêbado caminho em desencanto
Não poderia dar sequer sinal

E o vandalismo invade cada passo
E quando novo rumo ainda traço,
Aguardo tão somente o meu final...

25562

E vejo que não foi; querida, assim
O mundo que traçara no passado
O gesto repetido cancelado
Percorro e já sem flores o jardim

Estúpida quimera vê ao fim
O tempo com certeza mais nublado
E quando se percebe o torpe Fado,
Acendo o que me resta: este estopim

Bombásticos delírios de um poeta
E tendo a minha vida em frágil seta
O peso das vergastas não esqueço,

Não fora mesmo assim, minha querida,
Invalidando enfim a tosca vida
Marcada a cada queda, em vão tropeço.

25561

Estás comigo, amada, aqui ao lado
E sei dos tão diversos dissabores
Gerados pelos medos, vãos temores
Há tanto que protelo o anunciado

Momento toscamente desejado
Ainda que desvende em ti as flores,
Desejos muitas vezes tentadores
E neles ao final, um mero enfado.

Astuciosamente se percebe
O vário colorido desta sebe
Mesquinhos os abismos que traçaste

E neles minha queda se anuncia
Gerando o desfazer da fantasia
Enquanto tu te ris, tolo contraste...

25560

Eu posso te tocar, sentir teu cheiro;
Mas se equivale ao que pensara,
Desvio o rio em foz diversa e clara
E quando me percebo só me esgueiro.

Estranho o descaminho e vou ligeiro
Numa ânsia sem igual a alma declara
O medo que este olhar torpe escancara
Diverso do meu mundo corriqueiro.

E beijo em meus destinos, descalabros,
Altares sem sequer os candelabros
Desabo e percebendo tais ruínas

Ainda te gargalhas e ironia
É tudo o que deveras anuncia
Tua alma. Mesmo assim tu me dominas...

25559

O dia renascendo, iluminado,
Seria uma notícia prazerosa,
Mas quando não se vê sequer a rosa
O que farei do velho e agreste prado?

O peso em minhas costas demonstrado
Em noites claras traz a caprichosa
Verdade onde o prazer já nem mais goza,
E o templo que criei desmoronado.

Procuro pelas ruas o esmoler
Sabendo aceitarei o que vier
Esfaimado pedinte sem paragem.

E tendo no horizonte um sol vazio,
O estúpido caminho ora desfio,
Nublando dentro em mim tal paisagem...

25558

Ressonas sobre fronha e travesseiro
Pensando no talvez que nunca veio
O quadro se desenha e sem rodeio
O mundo não seria lisonjeiro.

Acordas e não vês o companheiro
E quando se percebe estando alheio
O gosto delicado de um recreio
Morrera há muito tempo em vão ribeiro.

Assédios tão comuns na juventude
Agora a fantasia não ilude
E a queda de um andaime é tão comum.

As pernas varicosas, olhos mortos,
Na vida coletados os abortos,
De amores que sonhara; vês nenhum...

25557

Beijo-te com carinho, aliviado,
E sei quantas quimeras enfrentei,
A sorte muitas vezes disfarcei
Em risos de ironia. Sei do fado

Que tanto tem por vezes destroçado
Caminho mais tranqüilo eu não trilhei,
E agora quanto mais longínqua a grei
Maior o meu desejo sem enfado.

Percorro os meus anseios e detenho-me
Nas furnas mais terríveis, mas embrenho-me
E sigo sem temer os vendavais.

Abismos corriqueiros, precipícios
Não deixo nesta estrada mais indícios
E sigo mesmo em tempos tão venais...

25556

O dia enfim renasce alvissareiro
E nele não se vêm brumas atrozes,
E quando se percebem noutras vozes
O canto que pensara o derradeiro,

Mergulho meu delírio num tinteiro
E alçando fantasias mais ferozes,
Encontro os descaminhos, bebo as fozes
E sei do mar imenso, timoneiro.

Infaustos coletados pela vida
Apenas me preparo em despedida
Na lápide epitáfios não desejo

Assumo a derrocada de um poeta
Que tendo a fantasia se completa
Somente no vazio de um lampejo.

25554

As esperanças riem; fartas, sonsas
E fazem dos meus dias histriônicos
Caminhos que se mostram desarmônicos
Guiando as fantasias, geringonças

Diversas das que tanto concebi
E o peso me envergando não permite
Se crer nalguma luz pós o limite
E dele não retorno mais aqui.

Esgarçam-se os meus últimos momentos
Em furiosas sendas, vago em vão
E sendo o meu destino o de um senão
Que tanto se perdera sem alentos

Espraiam-se os delírios numa tenda
Diversa da que o sonho inda desvenda...

25555

Ao ver as tuas costas, nuas, alvas
Entranho por caminhos mais audazes
E sei que tantas vezes tu me trazes
Apenas tão somente estas ressalvas.

E delas quando expressas negação
Escondo os meus desejos e pereço
Enquanto solitário me envelheço
Momentos mais felizes voltarão?

Não creio em tal falácia e sigo assim
Estúpido palhaço sem juízo
E tendo muito mais do que preciso
Sem medo vou chegando mesmo ao fim.

Etéreas ilusões desenfreadas?
Há tanto tempo sei abandonadas...

25553

Ao ver especular imagem minha
Desnudada figura envelhecida
Marcada pela angústia de uma vida
Que sei ser tantas vezes tão daninha

E quando a morte chega ou se avizinha,
A sorte se anuncia desprovida
De toda a maravilha e a despedida
Sem lágrimas aos poucos se adivinha.

Descrevo a minha senda sem pudores
E vejo após as chuvas, tentadores
Caminhos que me levem ao passado,

A juventude; esqueço em algum canto
E sinto do final doce acalanto
Momento tão temido e desejado...

25552

Tomado por encanto, adoradores
Dos mais diversos deuses encetando
Caminho tantas vezes duro, brando,
E nele seus poderes redentores,

Quem dera se somente fossem flores,
A espada muitas vezes desnudando
Na farsa de um cenário aonde um bando
Mergulha e dissemina seus terrores,

Aonde poderia crer que um Deus
Gerasse ao mesmo tempo o ledo adeus
E a fúria invés de amor entre os irmãos?

Somente numa mente doentia
A morte salvadora se faria
Tornando os nossos dias toscos, vãos...

25551

Só isso, simplesmente, já me acalma
Saber dos meus fantasmas e enfrentá-los
A mão se lapidando em tantos calos,
A cada nova queda, novo trauma,

E sinto que se perdem dentro da alma
Momentos de raríssimos regalos
Sabê-los e vivê-los mesmo amá-los
É conhecer da vida toda a palma.

Mas sendo tão servil e insano creio
Tempestuoso mundo verte anseio
E nele me entranhando solitário,

Vestindo a falsa imagem que ora crio
Viver é com certeza um desafio
Um passo no vazio, temerário...

domingo, 7 de março de 2010

25550

Aonde uma alegria sempre alcança
Além do que talvez eu possa ver
A vida se trazendo em desprazer
Não deixa nem sequer vaga lembrança

De um dia aonde a sorte inda se lança
E mostra a divindade noutro ser,
Pudesse em radioso amanhecer
Vivenciar os lumes da esperança.

Mas vejo que, cansado, nada tenho
E mesmo quando vejo algum empenho
Do sonho tão cruel quando inocente

Eu bebo a podridão deste vazio
E toda a solidão sinto e desfio
Maior do que deveras se pressente...

25548

Roubando o próprio brilho desta vida
A sorte se desdenha a cada passo
E quando um novo tempo, inútil, traço
Percebo quão foi fútil a investida.

Espreito desde já minha partida
E marco com terror este compasso,
Se tudo o que fizera enfim desfaço
O medo conflitando com a lida.

Esgarçam-me os temores tão venais
E sei que minha voz traz o jamais
E nele o peso enorme que carrego.

Aonde prosseguir se nada vejo
O sol somente um frio e vão lampejo
Prossigo desta forma, tolo e cego...

25549

Olhar para teus olhos infinitos
E ver ainda a força juvenil
Diversa do que em mim já se previu
Na morte em seus venais e tolos ritos,

Ainda escuto ao longe os ecos, gritos
De um tempo mais amargo e teimo vil
Aonde um coração bem mais servil
Tentara decifrar velhos escritos

Traçando o meu futuro em holocausto,
O quando se mostrasse ainda em fausto
Seria uma mentira deslavada,

E após permanecer em sonhos vagos,
Da morte ao conhecer mansos afagos,
Minha alma se entregando não quer nada...

25547

Acreditar em sonhos mais bonitos
Depois de conhecer a realidade?
Estupidez não traz felicidade
Os dias prosseguindo assim, aflitos.

E os sonhos são decerto meros mitos,
O mundo se transborda em crueldade
Por mais que um tolo sonho ainda brade
Mais forte do terror, imensos gritos.

Salvasse pelo menos um momento
E nele com ternura e sentimento,
Mas quando a vida expulsa a fantasia

Mortalha se anuncia em pleno luto
E contra tal quimera não mais luto
Nem mesmo outro destino entenderia...

25544

Olhar para os teus olhos e sentir
A pútrida ilusão que se esvaece
E enquanto a realidade me enlouquece
Procuro da esperança um elixir

Sagrando em minhas mãos tolo porvir,
Medonha fantasia ora se tece
Negando com certeza qualquer prece
Matando devagar e sem sentir.

Aos pés desta terrível solidão
Somente os meus espinhos moldarão
Jardim feito em abrolhos e daninhas

Perceba esta penúria em fúrias feita
E quando o meu olhar já se deleita
As almas caminhando mais sozinhas...

25546

Não ver mais nada além neste arrebol
E ter esta certeza de um vazio
É como se tivesse em desafio
A luta contra o brilho de algum sol,

E o medo me transforma em caracol,
Deixando como herança este fastio,
E nele as esperanças não recrio,
Jamais imaginara outro farol.

Seguindo em solidão a vida passa
E quando se percebe a mesma traça
Devora o que restara de um poeta,

E a boca da pantera escancarada
A morte há tanto tempo anunciada
Agora no teu gesto se completa...

25543

Meus guias que acompanham onde eu for
Já sabem dos destinos que traçaste
E a cada nova queda outro desgaste
De um corpo que percebo decompor

E nessa podridão, como um andor
A vida sonegando qualquer haste
Jazendo pouco a pouco, velho traste
Somente este vazio, este estupor.

À parte do que possa a caminhada
Por mais distante e longa, a dura estrada
Não deixa que se veja algum final.

E o beijo amortalhado da quimera
Matando o que restou da primavera
A vida sonegando a mim seu sal.

25542

Desculpe se causei algum transtorno,
Mas nada se compara à cicatriz
Deixada como herança e tanto diz
De um tempo solitário, amargo e morno.

O medo me servindo como adorno,
No olhar de um torpe ser, um infeliz
A vida modifica seu matiz
Sem nada, brilho ou sonho em seu entorno.

E assíduas ilusões batendo à porta,
A face da esperança semimorta
Expressa a violência do não ser.

E quando me entranhasse em seu dissídio,
Apenas me restando o suicídio
E nele última forma de poder...

25541

Também sofri demais e ainda vejo
Em meio às tempestades ventanias
E nelas com certeza me trarias
Além de simples dor, vago lampejo

E quando exposto ao vento ainda almejo
Um cais que possa dar as garantias
Diversas das estúpidas vazias
Manhãs onde ninguém sinta ou desejo.

Herméticos momentos solitários
E neles desprazeres sendo vários
Deixando-me confuso e sem sentido

Aonde houvesse brilho nada creio
E apenas vou herdando um tosco anseio,
Num corpo há tanto tempo desvalido.

25540

Não deixo de pensar nenhum segundo
Nas tantas e improváveis soluções
Diversas das que agora tu me expões
E segue o coração audaz e imundo,

Das podres ilusões quando me inundo
Vivenciando dores e os vergões
Marcando as minhas costas expressões
De um tempo mais cruel. Sou moribundo.

E tento disfarçar meu desengano
No olhar que tantas vezes é profano,
Mas traz os traços duros do abandono.

E quando eu me percebo em noite escusa
A morte em descalabro ainda abusa,
Nem mesmo do cadáver eu me adono...

25539

A vida se transcorre em turbulências
Diversas das que um dia imaginara
Uma emoção feliz é muito rara
Não adiantam mais as diligências

Na busca por sorrisos e clemências
Ausência de um carinho se declara
E a solidão persiste vã e amara
Enfrento as mais terríveis penitências

A morte talvez seja a solução
E nela fartos brilhos tomarão
O céu que se tornou escuro e frio.

Ao ver a etérea sombra de um passado,
Quem sabe no morrer veja outro lado,
E o encanto mesmo mórbido desfio...

25538

Vivendo tão somente um canto lento
Assentam-se os caminhos mais cruéis
E tento mesmo ausente destes méis
Domar o mais terrível pensamento,

Aonde se procura um manso alento
Encontro finalmente amargos féis
E os dias entre fúrias, carrosséis
Girando sem parar e me atormento

Inútil prosseguir, disso bem sei,
Quem faz de uma esperança tosca lei
Jamais conhecerá realidade

E tendo nos meus olhos o horizonte
Nublando sem o que o sol inda desponte
Somente a gelidez venal invade...

25537

Diverso do que tinha impaciência
Tomando meu caminho não permite
Que eu siga muito além deste limite
E assisto à evolução da decadência

E o corpo em sofrimento tem ciência
Da morte que deveras acredite
Tornando-se presente já palpite
E tendo a poesia esta incumbência

De esclarecer aos olhos do poeta
Ainda se envolvendo em outra meta
Esquece de se olhar defronte o espelho

E tendo esta verdade indiscutível
O pânico se mostra indescritível
Não sigo mais sequer qualquer conselho...

25536

Tomando meu caminho, cerca o vento
E nele me percebo em dor e cruz,
Aonde se pudesse ver a luz
Distante prosseguindo o pensamento,

Restando tão somente este momento
Que às trevas mais terríveis me conduz
E como praga a dor se reproduz
Deixando para trás contentamento.

Vencido pela angústia passo a ver
Somente a minha pele envelhecer
E as rugas neste espelho retratando

A vida que se foi sem harmonia
E quanto mais feroz a ventania,
Mais longe, no passado, um tempo brando...

25535

E traz na noite fria esta dormência
A ausência de quem tanto desejara
A vida ao mesmo tempo desampara
E leva pouco a pouco a tal demência

E tendo mais diversa uma cadência
A sorte se desfia, crua e amara,
Na poesia a luz que se escancara
Talvez seja uma forma de clemência.

A quiromante tanto me dissera
Que amor não resistindo à primavera
Teria tal inverno rigoroso,

Auspiciosos sonhos? Pesadelos,
E a cada noite posso enfim revê-los,
Distante do que foi prazer e gozo.

25534

Querendo estar contigo e vendo que
Caminhos diferentes a trilhar
Cerzida sorte em tétrico tear
Procuro o meu retrato, mas cadê?

Se tudo o que deveras já se crê
Persiste muito aquém do imenso mar,
Aonde com firmeza navegar,
Se uma alma se tortura e nada vê

Sequer as velhas sombras do que fomos,
E quando desta vida em frágeis gomos
Expresso a mais completa solidão

Querendo ou não querendo sigo assim,
Apenas aguardando então meu fim
Deixando para trás qualquer verão...

sábado, 6 de março de 2010

25533

Na cama do hospital pensava em ti
Distante dos meus olhos, solidão.
E quando chega o tempo, a decisão
Deveras muitas vezes me perdi,

E tendo todo mundo bem aqui
Guardada uma devida proporção
Enfronho nos meus olhos a emoção
E dela sem perdão eu me embebi.

E a morte se aproxima dos meus dias
E nela se deixando as utopias
Somente a poesia me acompanha

E o gesto palatável diz amor
Mas quando vejo o rosto sedutor
Da morte já concluo a minha sanha...

25532

O mundo bem depressa modifica
As ordens naturais e transformando
O que pensara outrora bem mais brando
Agora se não luto, mortifica

E tudo transcorrendo não explica
O medo sobre nós já desabando
E o todo a cada dia mais pesando
A teoria aqui nunca se aplica.

Imprevisível passo leva à queda
E quando noutras tramas vida enreda
Percebo quão inútil deve ser

Quem tanto se perdendo em nada crer
No abismo feito em trevas já mergulha
E não vê da esperança uma fagulha...

25531

Com olhos dispersivos, me perdera
Do rumo já traçado em poesia
E a sombra do passado ainda urdia
Matando o que esperança concebera.

E o vento benfazejo de um sorriso
Ameno transformando o gelo em brisa,
Maturidade chega e já me avisa
Do passo necessário e mais preciso.

Vestindo esta emoção que é temporã
O amor rompe barreiras e, acredite,
Não respeitando enfim qualquer limite
Promete um sol imenso na manhã

Legado que pretendo cultivar
Imerso neste encanto a me tomar...

25530

Agora que me chamas também tento
Buscar esta esperança que perdi
E dela redundando sempre em ti
Olhar tão carinhoso e sempre atento,

Vencer os dissabores, meu intento
E deles traduzir melhor aqui
Num verso demonstrando o que senti,
Após um tempo amaro e turbulento.

Estando solitário e a depressão
Negando nos meus olhos um verão
Incendiando em fúria cada dia.

E nele a rotineira dor traçava
Numa alma sem destino e quase escrava
A morte do que fora poesia...

25529

Assisto ao derradeiro sonho que alimento
E vivo entre as neblinas, noites fartas
E quando dos teus dias me descartas
Deveras assumindo o meu tormento.

Assíduas ilusões e o pensamento
Jogando sobre a mesa as mesmas cartas
Dos âmagos profanos nunca apartas
Quem tanto se envolveu em sofrimento.

Perfaço o meu caminho em falso passo
E quando dos meus erros me desfaço
Não traço soluções, apenas sigo

E nesta invalidez uma alma insana
Medonha caricata tanta engana
Sonega ao penitente algum abrigo.

25528

Um mar feito em sargaços e corais
Distintas cores traçam o oceano
E quando se percebe cada engano
Os dias em procelas são venais.

Vagasse por espaços, siderais
Momentos em que vejo o ser humano
Na mórbida impressão de perda e dano,
Vislumbro atocaiados animais

Vorazes e insensatos neste bote
Aonde a mortandade se denote
Por tanta estupidez e vilania.

Porém esgoto pútrido e feroz
Ouvindo mais distante a sua voz
Covardia se torna valentia...

25527

Sequer estrela pálida percebo
Na treva que tomando a minha vida
Há tanto em fúria imensa decidida,
Diversa da esperança que concebo.

Eu sei que novo sonho é um placebo
E a cada amanhecer outra ferida
Expressando uma noite mal dormida
E da aguardente amarga – amor – eu bebo.

Pudesse ter nas mãos o meu destino
A faca, a foice, o tiro em desatino
O medo escancarando este delírio

E vendo tão somente o que hora herdei,
Vazio que deveras encontrei
Traduz sem ter retoques meu martírio...

25526

Das noites que brumosas eu enfrento
Após as tão sonhadas calmarias
Diversas das que em sonho fantasias
Tocadas pela mão de intenso vento.

E quando em luzes frágeis inda tento
Vencer os meus terrores tu me guias
E levas aos demônios que recrias
Tomando este arrebol medo e lamento.

Angústias tão comuns de quem procura
Um tempo aonde possa ser feliz,
E quando mais distante ou por um triz

No olhar ensimesmado, tal loucura
Abisma com seu vário ingrediente
Por mais que a solução audaz se tente...

25525

Horrivelmente imerso em trevas sigo
E tanto quanto posso ainda creio
Que enquanto houver um sonho ou mesmo um veio
Ainda se verá quem sabe, abrigo.

Empesteando a vida não consigo
Vencer a fantasia que rodeio
E dela muitas vezes mesmo alheio
Percebo bem sutil, medo e perigo.

Enveredando sendas mais profanas
Proféticos oráculos; predizes

E tentas discernir gozo de dor,
E quando vejo o encanto decompor
Chagásicas imagens: cicatrizes...

25524

Qual fora um tempestade um porto além
Do que pensara outrora ancoradouro,
Nas ânsias mais vulgares, nascedouro
Do pântano que uma alma vil contém.

E sendo que deveras sou ninguém
E disto faço a glória de um tesouro,
O sonho que pensara imorredouro
Desnudo se transforma e nada vem.

Adentro a fantasia, vil senzala
E a voz que se inebria já se cala
E escalando paredes a alpinista

Vontade transcorrendo em vagas ondas
E mesmo quando fútil me respondas
Nenhum sinal de paz aqui se avista...

25523

Vetustos caminheiros fragilmente
Estendem seus cadáveres em sonho
E quando num conjunto decomponho
A sorte se tornando mais ausente

Em cândidos momentos que se tente
Viver além de um ar tosco e bisonho,
Reconstituo a senda e assim me oponho
Ao que seria inútil penitente.

Azedam-se as vontades e esperanças
Articulando em vão as fortalezas,
E quando em voz sonante tais defesas

Ainda que tão frágil vês e alcanças
Gerando pandemônios entre risos
Legando ao nada ser, cruéis avisos...

25522

Revelas entre velas e velórios
Mordazes emoções em rito falso
E quando bebo em ti meu cadafalso
Momentos que vivera tão simplórios

Atando com denodo em tons mais vários
A cada caminhada outro percalço
E sigo em pregos, brasas, me descalço
Compartilhando tantos adversários.

Um execrável ar empesteando
Aonde se pensara bem mais brando
Fenecendo a ilusão que não sustento.

Ao deus-dará seguindo em prontidão
Vencido pelas trevas que verão
O derrotar de um sonho, violento...

25521

Decorrem dos meus vários pesadelos
Metáforas que traçam morte e dor
E quando me percebo em vão andor
Momentos terminais eu posso vê-los

E bebo da ansiedade seus apelos
Sentindo a minha face a decompor,
E nela se adivinha este sol-pôr
Envolto pelos medos e desvelos.

Incréu vasculho restos do que fora
E a morte mesmo sendo sedutora
Propaga dentro em mim lamas diversas

E pantanoso dia se anuncia
Matizando em gris minha agonia
Inebriantes féis que em mim tu versas...

25520

Se lúgubres parecem paisagens
Os antros que freqüentas dentro em ti
Extraem o que há tanto apodreci
Eternizando assim em toscos gens.

E vândalos porfiam tais miragens
Escandalosamente eu percebi
O quão se faz do nada mesmo aqui
Distante das benditas vãs paragens.

E quando as engrenagens se emperrando
As águias e os demônios revoando
Percebem teu olor adocicado

E o fardo se tornando bem mais leve,
Tua alma em lama feita, já se atreve
Aos prazeres ausentes no passado...

25519

Hominais delírios, Paraísos,
Infestam os meus olhos e não creio
Que apenas tendo enfim qualquer receio
Os dias poderão ser mais precisos.

A sorte em morte trama seus avisos
E goza do final, cruel anseio,
Enquanto do vazio sigo alheio
Vou contabilizando os prejuízos.

Juízos se finais ou nada tendo,
O mundo se desnuda em estupendo
Momento quando estás e nada além.

Após a podridão deste teu cerne
Uma alma em negação, ao fim se hiberne
Enquanto novas levas sempre vêm.

25517

Análogos caminhos percorridos
Pelos viventes seres desta Terra
E quando a morte chega e o ciclo encerra
Distantes dias morrem nos olvidos.

E os sons que outrora em vozes já perdidos
A porta com firmeza agora cerra,
Sobrando algum sinal da torpe guerra
Travada contra os sonhos e as libidos.

Assim hereditárias ilusões
Idênticas às tantas que me expões
Mutantes emoções proferem vagas

E quando devorada pelos vermes
Os restos destroçados, pois inermes
Serão do que desejas, tuas pagas...

25518

Exóticas visões em contraluz
São fatos corriqueiros e banais,
Mas quando nestas farsas demonstrais
Caminho que deveras nos seduz

Espúrias emoções expondo a cruz
Que tanto, sem saberes desejais
E nela se anuncia o ledo cais
Marcado a ferro e a fogo, peste e pus.

Estéticas diversas vos dominam
E nelas vossos sonhos determinam
Arcaicas fantasias de beleza.

Após a podridão vos conhecer,
E nada do que vedes irei ver
Não há como enfrentar tal correnteza...

25515

Delicado e suave sentimento
Já não comporta um peito que se deu
Ao mais terrível medo e bebe o breu
No qual com mui prazer eu me atormento.

E sendo tão volúvel quanto o vento
O mundo que deveras concebeu
Quem morto em plena vida sabe o seu
Caminho em tempestade e me arrebento.

Nas pedras e falésias, cais distante,
Aonde se entregara um navegante
Se tudo não passou de falso sol.

E tendo inebriado o timoneiro,
O encanto em podridão é derradeiro
E nega a quem veleja algum farol.

25516

Iridescências, nega esta manhã
Que tanto desejara em outra face
Esgarço o meu caminho em tal impasse
E a vida preconiza a fria cã

Agrisalhado olhar, espúria e vã
Farsante que meu dia ainda embace
Estraçalhado sonho em que passe
A vida sempre atroz, cruel, malsã...

E vingo-me das hordas que me deste
E bebo mesmo pútrido ou agreste
Em fartos goles, todo o desatino,

E quando me percebes muito além
Sorrir com ironia é o que convém
E vendo o teu esgar, eu me alucino...

25514

Erráticas e espúrias ilusões
Ascendem ao jamais poderei ter
E quanto neste nada o teu prazer
O mundo em crua face tu me expões.

Negrejas os meus dias, vãs neblinas
E tramas com furor outros vazios,
E em plenas esperanças desafios
Que aos poucos com terror tomas, dominas.

E assisto aos meus momentos terminais
E deles purulentas pestilências
Aonde proferisses inocências
Momentos tenebrosos tão iguais

E o pântano que legas como herança
Traçando um vago plano de vingança...

25513

Astênicos momentos desfraldados
Antrazes entre lutas e batalhas,
Nas ânsias mais profundas, as navalhas
E os cortes tão terríveis, lacerados.

Evisceram caminhos entranhados
Ancoram quando ausente tu mais falhas
No peito o falso gozo de medalhas
Ascendem aos inúteis vãos recados,

Terríveis ventanias, porto além
E quando se percebe nada vem
Nem mesmo este prazer em que sacias

Na terebrante e insólita facada
A mesma sensação do eterno nada
E as mãos que tu me deste estão vazias...

25512

Florescem alvas formas nos meus olhos
E delas encetando meus delírios
Crisântemos, verbenas, dálias, lírios
Prazeres reconheço e colho aos molhos.

Por mais que tantas vezes acidula
A vida não se perde em poucas luzes,
Arranco do canteiro torpes urzes,
Mergulho no teu corpo, em fúria e gula

E teimo em descumprir qualquer tratado,
Fronteiras não conheço nem limites,
E quando em minhas mãos, mais te permite
O sonho se desenha desvendado.

E esplêndidas manhãs anunciadas
Em luzes mais profanas consagradas...

25511

Carnais delírios tomam minha rota
E entranham delicadas maravilhas
Aonde com furor as armadilhas
Permitem a delícia em bancarrota.

Minha alma neste instante sente e nota
Diversas emoções aonde trilhas
Molduras tão sublimes formas, brilhas,
E o sonho tal beleza em luz adota.

Arranco do passado a dor venal
Aflora-se o desejo em sol e sal
Mareias com teu corpo em água clara.

Excelsos os caminhos percorridos
E os sândalos que exalas, percebidos
Nos gozos em que a fúria se declara...

25510

São purificadores os anseios
Que tanto encanto trazem e me tomam,
Poéticas loucuras já nos domam
Com sôfregos delírios, belos seios.

E adentro os teus caminhos sei dos veios
Dois corpos quando em fúria ora se somam
Harmônicos prazeres nos assomam

Tentáculos divinos nos enlaçam
E as trevas bem distante quando passam
Realçam o teu brilho inusitado,

Em abordagem lúbrica um corsário
Tomando de teu corpo este estuário
Luxurioso templo emoldurado...

25509

Venusianos montes versam gozos
Impudicos caminhos entranhados
E neles ânsias feitas em pecados,
Mordazes, mas audazes, maviosos.

Em lúbricos detalhes prazerosos
Olores tão diversos desenhados
Sidérea fantasia em nossos Fados
Volúveis, mas sutis, voluptuosos...

Alvíssima manhã das cãs distante
Imensidade em raio deslumbrante
Partícipes de insânias venturosas

E nelas entre luzes mais profanas,
Deliciosamente tu me explanas
Delírios no momento em que mais gozas...

25508

Véus brancos em venéreas maravilhas
As aves em seus vôos vão levando
Ao vento o tempo atento em raro bando
Enquanto mais atenta em luzes trilhas.

Ancoras em corais, sobejas ilhas
Expressam recomeço imerso quando
Aos poucos furnas, urnas desnudando
Mudando a direção conforme brilhas.

Exalas o perfume e me iluminas
Num lume extasiante e tão fugaz,
Lascívia perpetrada em loucas minas

Esguia silhueta se desnuda
Delírio que em martírio satisfaz
Cenário em tom tão vário se transmuda...

25507

Grinaldas desfraldadas pela lua
No vértice de um céu em pratas feito,
Audaciosamente insatisfeito
O pleito mais distante, atroz, flutua

O sonho que ora enfronho e ledo atua
Enquanto em quarto escuro e frio deito,
A claridade invade e me deleito
Imagem qual miragem bela e nua.

Ondulo entre o não ser e o ser além
E quanto encanto o canto ainda tem
Que possa confessar em versos lúdicos,

Momentos entre tantos temporais
E quando em brando vento mergulhais
Em vosso olhar luares quase lúbricos...

25506

Entoas entre tons mais dissonantes
Momentos variáveis e ferinos
Atando aos nossos pés tais desatinos
Perpetuando luzes deslumbrantes

Bem querência; tomaste em vãos instantes
Dobrando com furor último sino
E quando em brando vento me alucino
Destróis inlapidado diamante.

Embrutecida acidas nossa vida
E trazes em mil fases, despedida
Acidulando agora o que restara.

E a cândida ilusão se torna fútil,
O passo em contrabando segue inútil
O tempo em voz velada se dispara...

sexta-feira, 5 de março de 2010

25505

São inexatas formas as que trago
E trafegando em ruas mais diversas
Quando deveras vês e desconversas
Percebo como fosse algum afago

O gosto desta insânia quase mago
Nas horas que nos sonhos vão imersas
Imagens desenhadas e dispersas
Versando sobre o nada, não apago.

Acendo outro cigarro e fumo além
Do que em verdade posso ou me convém,
Porém a morte traz esta saída

Que tanto procurara e não sabendo
Na angústia meu legado e dividendo
Uma esperança? Segue ao ar, perdida...

25504

Revelo-me em revólver e engatilho
Pensando no final mais condizente,
Sem ter sequer um porto que apascente
Seguindo este esperado e torpe trilho.

Aonde houvera outrora um andarilho
Agora se percebe em ar demente
Um ser que desta vida vai descrente
Cansado de escutar mesmo estribilho.

Audácia não se faz em suicídio
A vida se transforma num dissídio
E deste caminhar eu já me aparto

Depois de tantos dias e inseguro
Na ponta do revólver asseguro
A solução de um mundo vago e farto.

25503

Na lânguida expressão quase que irônica
Deitada calmamente sobre alfombras
Deixando em minhas ânsias fartas sombras
Nefasta maravilha serpe hedônica

Resumes minha vida em histriônica
Mortalha sobre a qual ainda assombras
Submetes meu olhar quando me alfombras
Com teu delírio atroz em voz harmônica

Numa expressão diversa da que outrora
A vida se mostrara e em paz decora
Perfil de um caminheiro envelhecido

Produzes maremoto em calmaria
Martirizado enredo que te guia
Numa explosão sobeja da libido...

25502

Quebrantados caminhos se perdendo
Em meio aos costumeiros vendavais
E neles percebendo ao longe um cais
Quem sabe meu final seja estupendo?

Em vossas mãos a fúria se vertendo
E quando meus desejos sonegais
Aonde quis agora é nunca mais.
E o sonho em pesadelo está morrendo.

Ingratidão selando o que deveras
Já fora no passado mais sadio
O tempo sem limites desafio

E nele sei que o todo degeneras
Deixando como herança esta mortalha
E a faca que mais fundo corta e talha.

25501

Alinho-me aos anseios que me trazes
E neles me perdendo vez em quando
Porquanto se mostrasse em contrabando
O olhar auspicioso engenha pazes.

Patéticos momentos, toscas bases
E o todo num pedaço se mostrando
Na visceral certeza trucidando
Prendendo-me em algemas e tenazes.

Vencesse calmamente outras manhãs,
Mas herdo prematuras, estas cãs
Que tanto agrisalharam a esperança

Numa irascível sombra de nós dois
O agora se perfila sem depois
Enquanto martiriza, sempre avança...

25500

Recatos entre os medos mais vulgares
Expressam o temor do amor que fere
Ainda que o prazer domine e impere
Estendo esta beleza em meus olhares.

Senzalas, salas, medos, deles pares
E quando o sonho morte regenere
Meu mundo neste mundo já se insere
Quereres redundando dos sonhares...

Antúrio enlanguescente, tinhorões
Venenos maviosos que me expões
Nas ansiosas noites mais veladas.

Das liras bardos fazem melodias
E vendo, temerosa, que tremias
Luxúrias em recatos declaradas...

25498

Martírios entre tiros, pedras, balas
E tramas das entranhas teus enredos
Segregas com vigor, falhas e medos
E quanto mais eu peço mais te calas.

As bases do meu mundo quando abalas
Deixando rastros falsos, passos ledos
São lassos os meus dias e em degredos
Transcrevo estes segredos noutras falas.

Falaz hipocrisia cria quem
Sabendo que o desvelo me contém
Aquém do que podia sendo amiga

Vencer a ventania mais freqüente,
Mas quando mais preciso que apascente
Tempesta que geraste desabriga.

25499

Na lúgubre figura asseguraste
O peso de uma obesa fantasia
E dela quando em pântanos desfia
Caminho para o sórdido desgaste

Ultraje que geraste como um traste
Que vaga pela insólita agonia
Assoberbadamente em utopia
A senda sendo sóbria; renegaste.

Mortalha onde queria paz equânime
Teu ódio contra ti em voz unânime
Permite um triste algoz que ora porfias

E nele te retratas muito bem
Fazendo o que deveras te convém
Como se fossem t’as fotografias.

25497

Exóticos caminhos, sendas falsas
Florescendo os abrolhos mais temíveis
Refolham-se ilusões em vãos terríveis
E as almas geram traumas, pois descalças

Em espinheiros fartos, cortes alças
Das balsas e dos botes implausíveis
Erráticos desníveis previsíveis
Em insensíveis trevas tu realças

Aonde há cibernético futuro
O passo descompassa e traz o escuro
Negando o resplendor pleno e temático.

Moldando assim enfim caleidoscópios
Porém não resistindo aos microscópios
O teu virulento ar, tão sorumbático

25496

Vagando em noite imensa, penso e crio
Em solilóquio vão venço ou me perco
E as dores entranhando fecham cerco
Acerco-me deveras do vazio.

E o vento vergastando em vasto frio
Do sonho mais bisonho adubo e esterco
E quando de algum terço ou reza acerco
Invernal e abismal granizo estio

Mudando a direção de vento e sombra
A sórdida impressão de novo assombra
Mundana fantasia estribo e açoite

Sem ter quem tentaria trazer luz
O vendaval revolta e me conduz
Traçando em treva e neve o meu pernoite.

25495

Rebeliões; empilhas aos milhões
Humilhas com teus risos vãos, sardônicos
Gerando bandos tantos desarmônicos
Tetânica e apoplética me expões

Esplêndidas belezas, turbilhões
Que tramas entre algemas e histriônicos
Caminhos muitas vezes vis e hedônicos
Voláteis astros e anjos; decompões.

Careço de cadências confiáveis
Padeço das demências mais palpáveis
E nelas são aráveis solos meus,

Angustiadamente a mente enriste
Um ar que, secular e ancestral triste
Prepara a amara morte em vago adeus...

25493

Num êxtase sem luxo e sem estase
Uma explosão sidérea em luz profana
Da qual eclode sonho e voz se emana
Fogoso gozo aonde o gosto apraze

Equânime loucura, escusa base
Avinagrada sorte desengana
Sagrada madrugada ora se empana
E os pântanos diversos versam fase

Acídula vergasta em gesto bruto
Um títere que, lúgubre, reluto
Astuto vendaval verte delírios

E deles círios negam azinhavres
Por mais que na verdade desagraves
Agravam-se deveras meus martírios...

25494

Burburinhos diversos versos versam
Versões de outros verões que não veria
Quem veste vergastada fantasia
Enquanto cantos, contos, desconversam.

Seguindo sem adendo se dispersam
Os passos em espaços, traço guia
E faço se disfarço em agonia
Submersos abissais que em ti conversam.

E arrastando os demônios que converges
Traçando os dias tétricos que imerges
Num âmago insensato atos entranhas

Díspares destes ímpares começos
E as messes que prometes são tropeços
Do avesso tuas vestes vãs e estranhas.

25492

Exorto os meus demônios e exorcizo
Os erros dos medonhos ecos trago
E cada vez venal o velho estrado
Aonde ondeio em dias, impreciso.

Descrédito de um édito sem siso
Proclamo enquanto tramo algum afago
Qual fora algum efebo ingênuo drago
Amores entre cores que matizo.

Esquemas ditam temas entre algemas
Das gemas preciosas que lapido
Furor extasiante da libido

Do pleito insatisfeito faço emblemas
Pulsares e quasares siderais
Em vossas vozes vibram vendavais...

25491

Broqueio cada farsa em falsa espera
Fenestrando deveras teus engodos
E neles transpassando vários lodos
Com os quais a vida degenera

E beijo a boca espúria desta fera
Prazeres enfronhados; quero todos
Nublando brandos bandos, antros godos,
Apenas pênsil pêndulo me espera

E contumazes erros cometidos
Gerados pela insânia das libidos
O olvido não repõe partos erráticos

Nem sátiros caminhos percorridos
Serão de qualquer forma, pois, ungidos
Tampouco os meus enganos sistemáticos...

25490

Revéis já transmudando os meus anseios
Esgoto vãs audácias, passos firmes
E quanto mais deveras reafirmes
Rebeldes caminhares ditam veios

Diversos dos meus vagos vãos rodeios
E neles mesmo quando tu me afirmes
E traces novas bases em que firmes
Os passos se perdendo em devaneios

Revelo-me volúvel, mas velado
As vastidões vasculho e em meu passado
Ventanilhas abertas não mais vejo

Vogara entre naufrágios e procelas
Borrascas entre farsas me revelas
E as velas enfronhando tempestades

À custa do viver incêndio e rosas
Esvaio-me em volúpias vaporosas
Enquanto em tanto encanto tu me invades...

25489

Regalos de uma lúgubre bacante
Enlanguescidamente dita normas
E quanto mais voraz tu me deformas
E tomas minha vida a cada instante

Aonde se pensara deslumbrante
Demônio em que decerto te transformas
E quando do teu âmago me informas
És serpe disfarçada em diamante.

Imagem tão sutil, paradisíaca
Hedônica figura que é satânica
Paralisia causas, pois tetânica

Vulcânica explosão que, demoníaca
Vendendo uma emoção quase que orgástica,
Depois se gargalhando vil sarcástica...

25488

Sistematicamente a mente, mente
Ou omite emitindo falsos guizos
Em vandalismos cismo se imprecisos
Vários versos versando insanamente

E quando tanto ou mais sigo descrente
Atento aos violentos Paraísos
Em virulências feitas ânsias sisos
Conciso ou preciso se envolvente

Venéreas maravilhas vencem sismos
Em viscerais vitórias cataclismos
Abismos, precipícios ócios, vícios

E pendulares âncoras do tempo
Estampam no meu peito o contratempo
Volvendo aos versos frágeis: meus inícios...

25487

Um feto que tão fátuo fui fugaz
Das fráguas freqüentara farsas fartas
Fuligem, farpa féretro e me enfartas
Com falsas e falazes, fútil paz

Feneço num falsete ou tanto faz
Se enfados ou fagulhas já descartas
Assisto à derrocada enquanto partas
E atento ao tempo tramo e entranho o antraz.

Noite aterrorizante antes do intento
E quando um brando andor ainda invento
Aceito teus conselhos velhos vãos

Espelho dentro da alma alça o vazio
E quando a vaga eu venço ou desafio
Desfio a fantasia em novos grãos...

25486

Natura se recria em minha vida
Esgotando a terrível mocidade
Enquanto bebo agora a insanidade
Percebo a minha força em despedida

A cada passo a sorte sendo urdida
Vencido pela incúria que me invade
Degrado-me em temível falsidade
Falências que carrego em voz perdida.

Agarro-me aos escombros, vãos destroços
E neles recompostas ilusões
Enquanto reproduzem aversões

Expondo apodrecidos, frágeis ossos
Na carcomida imagem me retrato
Um ser medonho e tênue quase abstrato...

25485

Moléculas diversas me compondo
E delas podridão já se percebe
A vida se perdendo desta sebe
E mesmo que respire decompondo

O que restou de mim agora expondo
Em caricata face que percebe
Do avinagrado sonho que ora bebe
Putrefato caminho em vão repondo.

Descrevo os meus demônios com palavras
Que sorrateiramente ainda lavras
Usando larvas, moscas, vermes, vândalos.

Eviscerada imagem marginal
Mudando o tão profícuo ritual
Negando essencialmente corte e sândalo...

25484

Reboa dentro em mim sombria voz
Danando o meu destino em vagas luzes
Aonde se pensaram flores, urzes
E a própria juventude é meu algoz.

O olhar entediado e quase atroz
Medonhas criaturas reproduzes
E tantas vezes vejo as mesmas cruzes
E nelas ansiedade estreita os nós.

Das díspares noções ações diversas
Imersas emoções ditam quimeras
E quanto mais assim te desesperas

As palidezes tantas vão dispersas
Universalizando o sofrimento
Não tendo noutro tento mais alento...

25483

Na transubstanciada dor presente
Aufiro os meus estranhos caminhares
E se fores astuta ao me notares
Verás o que deveras se pressente

No olhar deste fantasma qual demente
Ansiosa previsão em vagas, mares
Mudando em tempestades mansos ares
E neles permaneço incoerente

Evoco os meus demônios e prossigo
A cada nova espreita um inimigo
Vestindo este fantoche que sou eu

Mortalhas que ora visto visam ter
Após a fúria imensa algum prazer
Devorando o que em mim já se perdeu...

25482

Brados entre brandas madrugadas
Estúpidos gemidos de um fadado
A ter dentro de si sempre o passado
E as horas em penúria decifradas

Escracho caminheiro em vãs estradas
E nelas o meu corpo lacerado
Espalha o cheiro podre e adocicado
Carcaças decompostas, malfadadas.

Satânicas orgias, noite espúria
Nos olhos deste ser a farta incúria
Expressa o nada ter que me incendeia

E a lua em plenilúnio debochada
Transforma em pesadelo a torpe estada
Brumosa criatura segue alheia...

25481

Se resignadamente sigo agora
Depositando em lágrimas o quanto
Encontro a cada canto em desencanto
Certeza do não ser já me apavora.

O bêbado que pária em mim se aflora
Devora cada parte e traz no pranto
A súbita impressão de um vil quebranto
O monstro que assim gero não demora

E torna as minhas garras afiadas
Vasculha deste inferno tais entradas
E grava a ferro e fogo dentro em mim

Temáticas diversas, sonho e morte
E enquanto esta pantera eu não aborte
O corte me levando a espúrio fim...

quinta-feira, 4 de março de 2010

25480

Percebo tão sutis quanto inexatos
Caminhos que me levem ao teu braço
E quando nova rota ainda traço
Os dias se perdendo em tolos fatos.

Postergo os meus anseios, sinto ingratos
Momentos em que sigo cada passo
Levando à incerteza de um espaço
Torturas permitindo tais contratos.

Assisto ao meu final de camarote
E quando a realidade dita o mote
Profiro meu poema feito em dor

E sinto ser possível ter na mão
Além de se mostrar a exatidão
Pudesse destilar o bom licor...

25479

Tracejo uma sobeja maravilha
Envolta nos mistérios do desejo,
E quanto mais deveras eu protejo
A estrela com certeza nunca brilha.

E assim tanta tristeza se moldara
No vago de uma vida sem sentido,
O tempo muitas vezes soerguido
Produz imensa chaga, vil escara.

E teimo em prosseguir contra a maré
Sabendo que depois só terei resto
E quanto mais mordaz, torpe e funesto
Mais firmemente sinto tais galés

E delas não consigo me livrar,
E a morte se aproxima, devagar...

25478

Sutis imagens voltam do passado
E trama incoerências onde um dia
O medo que deveras já se urdia
Seguindo da esperança o vão traçado.

E o peso se é menor compartilhado
Ainda mesmo assim em mim ardia
Deixando mais silente a poesia
Moldando o figurino amortalhado.

Tecesse desde então nova saída
E quanto mais atroz a despedida
Maior o meu temor, esteja certa.

E quase ser feliz já não me basta
A face da verdade agora gasta
Aos poucos meu caminho em vão deserta...

25477

Cinzéis em preciosas gemas tramam
Arquétipos de jóias eternais
E quanto em minhas mãos vós derramais
Momentos mais audazes que reclamam

Aquém da realidade em se exclamam
Entranho velhos portos, ledos cais
E neles fantasias sensuais
Saudosas emoções por vezes clamam.

E sendo-vos leal não poderia
Ultrapassar sequer tal fantasia
Vivenciada em pranto, medo e dor,

Mas pálida figura se aproxima
Tornando mais pesado ainda o clima
Gerando tão somente um vil terror...

25476

Mortalha que reciclo a cada verso
E nele me entranhando em sombra plena
Enquanto a fantasia ainda acena
Eu ando sem destino, vou disperso

Adentro esta ilusão seguindo imerso
Nem mesmo a poesia me serena
E quando a morte surge vaga e amena
Permito-me sonhar com o universo

Dicotomias tantas, luzes fartas
E delas sem querer, silente apartas
Os meus momentos sóbrios onde eu creio

Na libertária voz que me sacia
E dela reencontrando a fantasia
Embora prosseguisse em vão e alheio..

25626

Quisera perceber um novo dia
Aonde a fantasia desmorona
Uma alma mais ferina até ronrona
Enquanto cada garra mais afia.

E a sorte que conheço, tão bravia
Durante a tempestade vem à tona
Das estradas que traço já se adona
Fazendo do meu mundo, a montaria.

Por vezes imagino em turbulência
O que pensara outrora em convivência
E sei ser impossível entre dois

Que tanto se engalfinham e se cortam,
E quando as fantasias nos exortam,
Sabemos quão sombrio este depois...

25625

Assumo estas facetas mais vulgares
E beijo o que se fez em luz sombria
Figura melancólica se erguia
Toando os seus acordes nos altares

E vejo recriados lupanares
Em meio a mais soturna fantasia
E dela o meu passado se recria
Atravessando em fúria tantos mares.

E o gosto de vingança ora se apura
A vida perpetua a mesma e escura
Estrada aonde um velho caminhante

Moldara o seu destino de andarilho
E quando sobre o pó ainda trilho
A morte se aproxima neste instante...

25624

Se as lúgubres paisagens descortino
E adentro com furor ou mesmo impávido
O gosto se mostrara bem mais ávido
Tomando sem pensar o meu destino.

O corpo lacerado e quase esquálido,
Restando o velho sonho de menino
E nele com certeza me ilumino
Por mais que o dia siga sempre pálido.

Equânime e sombria fantasia
Aguarda o meu final e se sacia
Nas artimanhas toscas que hoje enreda

E o pano se fechando no cenário,
O que pensara outrora temerário
Nem mesmo a paisagem torpe veda...

25623

Abrindo as minhas cartas encontrei
O fato presumível e esperado
Que tanto demarcou o meu passado
Servindo para mim conforme lei

E dele cada resto eu entranhei
Até ver o meu mundo dispersado,
O gosto tão amargo perpetrado
Adentra o paladar bem mais que sei.

Singela fantasia? Ledo ocaso...
O vento anunciando o fim do prazo
E agora só me resta a despedida.

Articular defesa? Para que?
No fundo te procuro, mas cadê?
Assim se resumiu a minha vida...

25622

Sistematicamente sigo só
E teimo vasculhar minhas entranhas
E quando a realidade tu estranhas
Erguendo do que eu fora, simples pó

O medo se aproxima e em firme nó
Defronte à multidão diversas sanhas
E nelas precipícios e montanhas
Preparam para mim o espelho: Jó.

Ocasos e mentiras se misturam
E delas poucas coisas já depuram
Quaisquer que procurassem desvendar

Retorno ao uterino e bom momento
Somente quando imerso me apascento
Regrido ao nada ser: último lar...

25621

A treva em nuvens densas desce à Terra
E toma esta paisagem ora sombria
E quando a imensidão já se porfia
O medo dentro da alma se descerra

A ventania lembra fome e guerra
A paz que procurei não existia
Tampouco ao encontrar farta agonia
Capítulo da vida não se encerra.

Audaciosamente dera um passo
Alheio ao que deveras já desfaço
Criando com meus pés o próprio abismo

E agora em noite tétrica e fugaz
Distante do que um dia quis ser paz
Molambo sem destino, ainda cismo...

25619

Ruidosas esperanças, não floreio
Com verso que talvez não mais traduza
A sorte que deveras tão obtusa
Esgota da ilusão a fonte e o veio,

E quando nos meus charcos banqueteio
Com lúbrica emoção que reproduza
Uma alma tantas vezes tão escusa
Deixando no passado o velho anseio.

Recreio-me com posta apodrecida
E dela se refaz a minha vida
Antraz que ora carrego dentro da alma.

Esmero-me em poder ver no holocausto
Apenas tão somente algum infausto
E a imagem produzida já me acalma...

25620

Levito entre os fantasmas que ora trago
E farpas tão comuns devoro e quero,
O mundo que se fora mais austero
Agora não percebo nem afago,

O tempo se transforma em podre estrago
E o corte aprofundado, mas sincero,
É tudo o que carrego enquanto emprego
O verso que pensara outrora mago.

Alquímicos poderes, tal cadinho
Transforma esta esperança em podre vinho
E bebo da vinhaça que me dás.

Da morte quando aos poucos me avizinho
Eu sinto tenebroso e bom carinho,
E nela descansando, enfim, em paz...

25618

Metástases carrego vida afora
E pútridas manhãs me destemperam,
E quando os tolos toscos degeneram
Apenas tumular voz já se aflora

A poesia há tanto foi embora
E os restos do que fomos inda esperam
Eméticas delícias onde esmeram
As ânsias mais vorazes. Luz descora...

E o cândido poeta adormecido
Agora pela vida envilecido
Aguarda tão somente este final

E nele se prepara nova senda
Aonde a fantasia se desvenda
Ou nada se transcorre triunfal...

25617

Na lúgubre paisagem desenhada
Pelo meu verso tolo, mas sincero
O fim deste tormento agora espero
Sabendo ao que minha alma é destinada.

Versando sobre a vaga e fria escada
Na qual a queda sempre em gozo fero
Produz esta fratura aonde quero
Ver minha vida em pus já retratada.

O beijo que se escarra em minha face
Aonde se mostrara cada impasse
E nele se refaz a velha história

Por mais que novo mundo ainda trace
Com ares de terror ou de vanglória
Legado ao nada ser, tosca memória...

25616

No íntimo me percebo um morto-vivo
E como fosse assim este zumbi
Vivendo do cadáver que escolhi
Dos sonhos mais felizes eu me privo

E sendo muitas vezes mais altivo
Vazio de esperança chego a ti
Atrocidades tantas mereci
E nelas do que fui anda vivo.

Alvissareiros dias do passado
Apenas um retalho costurado
Em meio aos falsos lumes que carreto

Apesar de saber que inda respiro
Preparo neste instante bala e tiro
Fechando em suicídio este soneto...

25615

Na farsa que traduz inútil vida
Cenário mais propício: ato final
E nele se perfaz o ritual
Aonde se vislumbra a despedida.

A faca pelas ânsias sendo ungida
E o bêbado caindo em meu quintal
Sarjeta dentro da alma é tão normal
E dela uma esperança segue urdida.

Perene poesia este soneto
Ao qual com virulência me arremeto
E bebo cada gota que espalhara

Do pus que dentro em mim ora alimento
E faço da carcaça o meu provento
Na imagem destroçada a vida amara...

25614

Astuta caçadora, uma esperança
Fugaz imagem trama após o nada,
E a carne pouco a pouco devorada
Traduz em sentimento esta vingança

Ao peso do que fui a alma balança
A cada novo dia a vergastada
Reacendendo a morte desejada
E nela a minha cruz, o tempo lança.

Obesas ilusões já não profiro,
E quando se prepara último tiro
A bala se entranhando no meu cerne

Acasos entre ocasos pretendidos
E os corpos de esperanças estendidos
É tudo o que me resta ou me concerne...

25613

Rebeldes caminheiros noite afora
À sombra do que tanto desejei
A podre sensação tomando a grei
E nela uma alma aflita se decora,

A fera que no espelho me devora
E beija este cadáver que entranhei
Mortalha em poesia deslindei
Vagando pela noite sem demora.

Escravizado sonho se moldando
De um tempo mais feliz, quiçá mais brando
Em criminosos passos assassinos

Expressa o suicídio inevitável
E o corpo em rapineiras palatável
Espera ao fim dobrar de vários sinos.

25612

Uma ávida quimera me destroça
E nada se percebe como herança
No olhar desta pantera uma vingança
Que quanto mais voraz melhor desossa

Abrindo esta cratera imensa fossa
A sorte mal assombra enquanto avança
E ao fundo desta poça ora me lança
E a vida gargalhando tudo endossa.

Esgarçado por garras tão venais
Restando ao sonhador os vendavais
E neles o vazio agora traz

A imagem decomposta da ilusão
E vejo se formata desde então
No espelho que ora miro: Satanás!

25611

Esgoto dentro da alma traduzindo
A vermiforme noite em pesadelos
Pudesse pelo menos revolvê-los
Teria sob o olhar fúnebre e findo

O tempo de viver que assim deslindo
Em trágicos momentos, percebê-los
E quanto mais possível envolvê-los
Tecendo a solução, mas eu prescindo.

Acostumado ao mesmo descaminho
Prefiro que me vejas já sozinho
Do que pensar ser minha salvação.

A morte não perdoa quem se entrega
E mesmo quando exposta e quase cega
Momentos mais tranqüilos se farão.

25610

O feto que abortara: fantasia
Em pútrido cenário se desfaz
E mesmo num sorriso tão mordaz
Soergue-se emoção e o dom recria

A morte vai tomando a poesia
E como fosse assim fria tenaz
Deixando esta emoção que sei fugaz
Amortalhado sonho em agonia.

Espúria lividez que, cadavérica
Traduz esta ilusão falaz e homérica
Vinganças preparadas pela sorte.

E tendo sob os olhos o horizonte
E nele cada lua que desponte
Trará um sonho em paz que me conforte.

25609

Pisando na carcaça que hoje sou
Estúpidos os passos que programas
E neles posso ver cadáver, lamas
E delas tradução do que restou

De um ser inusitado e aonde vou
Carrego nos meus olhos falhas chamas
Meticulosamente enredo dramas
E neles minha vida mergulhou.

Na lividez do sonho tumular
Putrefação se expondo devagar
E enquanto a cada estágio mais avança

Certeira caminhada para o fim,
Dourando em poesia o meu jardim
O medo se transforma em esperança.

25608

Ermos dentro da alma soam tristes,
Mas quando me percebo mais desnudo
Deveras caminhando quieto e mudo
Diverso do calor aonde existes,

Por mais que outros motivos bons me listes
O coração sem foco é tão miúdo
E nisto me percebo em tom agudo
Discernindo o terror por onde insistes

Tomar as minhas mãos e ter nos dentes
A clara tentação de uma mordida
E nela cada lacerando em vis gementes

Delírios satisfazem tua fome?
A carne que te entrego, carcomida
Enquanto a própria sorte me consome...

25607

Consola-me saber que a morte vem
E dela bebo a pálida quimera
Aonde se pensara fim se gera
A vida mais tranqüila em novo bem.

O peso do passado segue além
Do que suporta uma alma, mesmo fera
E quando a solidão me desespera
Revejo este cenário. Sem ninguém.

Apodrecendo aos poucos nada tenho
E nem sequer faria mais empenho
Já que descubro ser a negação

E a sórdida manhã beija a carcaça
O tempo sem remédios segue e passa
Espelha as noites frias que virão.

25606

Quem dera se pudesse ser teu alfa,
Mas Omega não posso mais sonhar
Buscando ter meu sonho em preamar
Correndo contra tudo, uma alma esfalfa.

E falo francamente sem refolhos
Que tudo tem decerto solução
E os dias mais sobejos mostrarão
Além de simplesmente vãos abrolhos.

Mas tudo se presume e nada faço
E o bêbado procura a luz, falena.
Minha alma a cada passo se apequena
Não deixo nem sequer um rastro ou traço

E entranho-me na morte que me espera
Atocaiada e bela, sutil fera...

25605

Agrestes as montanhas onde cevo
Mortalha que deveras caberá
E nela o meu destino se fará
Bem mais do que nos versos eu me atrevo.

Envolvo-me nas teias e longevo
O medo persistindo aqui ou lá
Meu erro a cada instante moldará
Invernal garatuja aonde nevo.

O prazo se findando e nada vem
Somente a frialdade e fico aquém
Do passo que permita da cratera

Vislumbrar uma luz que não existe,
E se pareço assim, mordaz ou triste
Que faço se matei a primavera?

25604

Negar a própria essência e prosseguir
Por vias tão funestas que me trazes
E nelas perceber as várias fases
Oráculos discernem meu porvir?

O peso de deveras conseguir
Enquanto prenuncio mais mordazes
Momentos onde pústulas e antrazes
Permitem a minha alma refletir.

Esgarço-me nos fronts e me permito
Saber que mesmo inócuo, sigo aflito
E assino a cada dia esta sentença

Na qual a morte surja deste nada
E como fosse assim predestinada
No túmulo concebo a recompensa...

25603

Corôo com meus temores esta vida
Aonde não podia crer na luz
Deixando os pesadelos quase nus
O medo calcifica enquanto acida.

E tendo neste olhar a despedida
O nada quando em nada se deduz
Prepara esta mortalha e reproduz
Vazio que encontrou, alma perdida.

Acendo este cigarro mesmo quando
Percebo minha vida desabando
Sem ar, já me esfumaço pouco a pouco.

A dívida que tenho não se paga
O beijo da mulher, cruel adaga
E vendo o meu retrato, eu me treslouco....

25602

Descrevo em solitária madrugada
Os vértices de um sonho, um pesadelo
E quanto mais atroz sinto vivê-lo
A imagem desta vida destroçada.

Jogado pelas ruas, na calçada
Condeno o coração a tal desvelo
E quando pelo encanto vago, zelo
Resposta se mostrando o mesmo nada.

Viver e ter apenas o caminho
Que leve á madrugada onde, sozinho
Mortalhas eu carrego e tão somente.

A pútrida manhã em luz desfeita
O medo vendo a cena se deleita
E mata desde já qualquer semente...

25601

Estúpida quimera me rondando
A morte se transforma em solução
E os dias repetindo este refrão
Aonde novos tempos vislumbrando

Já sei que nada tenho desde quando
Fantasmas me tomando a direção
Naufrágio deste barco sem timão
E o vento toda noite me assombrando.

Vivesse mais um pouco e poderia
Realizar enfim a fantasia
De ter no meu olhar um horizonte

Aonde mais sublime luz guiasse,
Mas quando vejo o espelho e o mesmo impasse
Impede que este sol, vago, desponte...