sábado, 17 de junho de 2006

Anarquistas, Graças a Deus

Recordo-me, no final dos anos 80, quando morava no Rio de Janeiro e havia a efervescência política no país, de um jornal que começava a circular.
Como leitor do Pasquim e sentindo uma atração por todos os jornais e revistas de humor que pululavam na época, este me chamou a atenção.
O nome do jornal (Planeta Diário) com manchetes bem chamativas e de duplo sentido, me atraiu de imediato.
Era um humor diferente, político, mas de uma forma original, anárquico.
Enquanto o Pasquim demonstrava uma atuação política mais orientada, com franca discussão e reportagens mais engajadas, esse jornal era totalmente irreverente, apresentando coisas como “Histórias de Fodas e da varinha de Condom”.
Essa anarquia era hilária, não poupando nem governo nem oposição.
Entre os editores do jornal, um me chamava a atenção, principalmente pelo nome, usado em uma piada clássica, Bussunda.
Pouco tempo depois, encontrei na mesma banca uma revista : A Casseta Popular.
Uma das capas desta revista foi épica. Um homem com a bunda exposta e com a cara do Collor – O CAÇADOR DE MARACUJÁS.
Durante a campanha eleitoral, enquanto havia a guerra entre a grande imprensa e os jornais de esquerda, A casseta popular e o Planeta Diário apresentavam uma alternativa a essa tensão.
Passada a eleição, tivemos depois o lançamento do “Macaco Tião” à prefeitura do Rio, idéia dos mesmos anarquistas.
Depois, na Globo, apesar das limitações impostas pelo “Sistema” Globo de “qualidade”, ou seja, censura, no “Casseta e Planeta”, nome alusivo ao início dos anárquicos humoristas, continuaram a dar uma bela opção ao humor tradicional.
Houve na época, uma resistência gigantesca a esse tipo de humor, me lembro de que Chico Anísio criticava muito o anárquico representado pela turma.
Lembro-me de ter atendido, num Hospital onde trabalhava num bairro de classe média carioca, um tal Cláudio Basserman, com asma brônquica. Quando o vi, logo reconheci no Basserman, o Bussunda que começava a aparecer na televisão.
O bom humor sempre acompanhando quem fazia do trabalho uma grande brincadeira, com direito aos “jacaré no seco anda”, “em caminho de paca, tatu caminha dentro”, entre outras coisas que habitavam e habitam o humor popular do país.
A morte prematura de Cláudio nos faz pensar neste país mal humorado, onde as velhas brincadeiras foram trocadas por agressões, onde o humor carioca foi substituído pelas guerras de quadrilhas de traficantes.
Onde as piadas que corriam entre os adversários políticos foram trocadas por ofensas pessoais.
Onde o convívio entre as diferenças se torna, a cada dia, mais difícil e sectária.
Essa morte, por enfarte, nos faz pensar até que ponto vale a pena o desgaste das relações inter-humanas.
A boa política da vizinhança, com direito a “implicâncias” e “gozações” está sendo trocada por agressões verbais sem sentido.
Se quisermos homenagear Bussunda e seus pares, precisamos fazer uma auto análise e vermos a que ponto poderemos ir com as trocas de ofensas, pura e simplesmente.
O Brasil está descambando para uma difícil política, a das agressões e da baixaria.
No âmbito político, tenho saudades de Brizola com sua irreverência, o “Sapo Barbudo” ou o “Filhote da ditadura” foi trocado por “Bêbado, Analfabeto, Ladrão”...
O riso está se transformando em ofensa e mágoa.
Tá na hora de pararmos e pensarmos até que ponto vale a pena isso tudo.
A velha sacanagem de chamar flamenguista de “urubu” e vascaíno de “bacalhau” corre o risco de enveredar para a loucura e a criminalidade dos “grupos” armados das torcidas organizadas paulistas.
É hora de mudarmos o tom, sob o risco de não termos nada a comemorar com a política nacional e com a democracia.
Que a anarquia, linda anarquia, deliciosa anarquia, se limite aos programas humorísticos...

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